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  • joaofranciscoamara1

Dias Nublados

Atualizado: 9 de ago. de 2022




Em rápida pesquisa nos dicionários de português, identificamos o conceito da palavra nublado enquanto: cheio de nuvens; nebuloso; nuvioso. Adiante, no seu sentido figurado, nos deparamos com àquilo em que há: tristeza; melancolia. Estes dois últimos afetos, amplamente discutidos pela(s) psicologia(s), como estados de ânimo em que incorre-se algum tipo de sentimento ofuscado ou, diga-se de passagem, menos "brilhante".


Em todo caso, nos interessa refletir sobre os dias em que o sol não dá as caras, dias ou temporadas, quem sabe, estações ou, também, regiões específicas em que o clima gelado e a presença constante de neblina ofusque os registros solares. Na literatura internacional, identificamos a seasonal affective disorder (SAD) - em tradução livre transtorno afetivo sazonal; quadro clínico descrito como um tipo de depressão que se relaciona com as mudanças de estação, estendendo-se do outono ao inverno. Mas, não é nosso objetivo discutir quadros clínicos, muito menos, estabelecer alguma reflexão diagnóstica, quero, contudo, discorrer sobre este fenômeno anual e, também, muito específico de cada porção do território brasileiro,


os dias em que o sol não dá as caras

Uma tendência em dias menos ensolarados é que sejamos direcionados ao encontro com tons menos vívidos, pendentes ao carvão, ao preto e o cinza. Escutando algumas conversas triviais nestes últimos meses, diálogos incompletos de porta de elevador, esquina de banco, percebi alguma queixa atrelada aos dias gelados e nublados do inverno, algo do gênero: "Ah, mas que coisa estes dias pintados de cinza!"... "Parece que já acordamos sem vida, tudo escuro.. nublado"... Havia algum espaço para confrontar a umidade do ar, ou pedidos de receitas para lidar com os "bolores" no interior da casa, vestígios de fungos alimentados pelos dias de frio e ausência de sol. Então, de que modo isto revela algo sobre nosso estado emocional?



de que modo isto revela algo sobre nosso estado emocional?


É certo que somos, independente da estação do ano, tomados por alguma labilidade de humor (leia-se alternância de humor), o que, de fato, é natural e esperado - afinal, somos humanos, sentimos e queremos deixar de sentir à todo instante e, oscilamos entre estados de maior animação e momentos mais deprimidos. Porém, o que poderia haver de tão particular nos dias ausentes de sol? Sem desconsiderar os fatores biológicos e neurológicos, como a interação neuroquímica ou a síntese de alguns hormônios específicos, quero chamar atenção para um fenômeno que fica ofuscado por trás das nuvens e que ganha valor a partir da palavra: nublado.


Quando dizemos que algo está nublado, é como se encontrássemos na palavra uma espécie de cifra para nossos sentimentos como a tristeza e a melancolia. A partir do momento que contamos, narramos, entonamos isto, estamos, também, ancorando nas condições climáticas esporádicas nossos afetos, visto que, é mais convidativo falarmos ou nos queixarmos do clima do que de nossas alternâncias de humor, não é mesmo?


De todo modo, as produções narrativas corriqueiras ou a forma como somos capturados por situações climáticas, passageiras ou até mesmo mais duradouras, pode estar enunciando esta cifra entre nós e nossos afetos - o modo como lidamos com nossa própria subjetividade. Ademais, estou convencido de que, em algumas situações, pode soar mais suportável falarmos sobre os mofos de trás do guarda-roupas, ou da bagunça climática, do que encararmos, de perto, nosso nevoeiro afetivo interno.


pode soar mais suportável falarmos sobre os mofos de trás do guarda-roupas, ou da bagunça climática, do que encararmos, de perto, nosso nevoeiro afetivo interno.

Em contraponto, não respondemos uma questão circunstancial: de que modo os dias sem sol interferem em nossas emoções? Diria que, como qualquer dia, eles interagem com nossas condições afetivas, interferindo no dia a dia, como uma espécie de gatilho (matriz) capaz de deslocar alguma neblina interna "que não cessa de se escrever".


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